Pensei que a guerra já tinha acabado há longos anos, mas afinal com estes encontros, dei por mim a lembrar-me de situações que ainda não esqueci.
Vou relatar um caso que até hoje não consegui esquecer.
Vou relatar um caso que até hoje não consegui esquecer.
Era Maio de 1973 ( se a memória não me atraiçoa), estávamos em plena época das chuvas.
O dia estava lindo e a tarde começara há bem pouco tempo. Tínhamos recebido instruções para nos prepararmos para fazer uma coluna a Mansoa. Há que fazer todos os preparativos que a missão assim o exigia. A tarde estava quente embora estivessemos na época das chuvas, portanto não podíamos esquecer o cantil da água e vai daí eu e o Bonilha ( nome carinhoso, de nome próprio Alexandre), que era do 1º pelotão, enquanto enchíamos os cantis de água ele lá me ia dizendo:
Quelhas não gosto nada desta coluna.
Tem calma Bonilha, Não há-de ser nada, não há-de ser nada, vais ver que é apenas mais uma coluna, ainda havemos da fazer muitas outras, daqui a pouco já cá estaremos novamente. Mas o rapaz, que era uma belíssima pessoa, parecia não acreditar muito em mim, mas lá tentei encorajá-lo, sabe Deus como, pois tinha plena consciência do perigo que representava aquela coluna.
Bom lá nos dirigimos para as viaturas que já estavam preparadas para arrancar. Não sei ainda hoje o que se passou, mas pareceu-me que havia qualquer desentendimento entre oficiais e furrieis sobre qual o pelotão que deveria ir na frente ( eramos dois pelotões, 1º e 2º ). Não quero adiantar mais sobre isso, mas julgo, se a memória não me está a atraiçoar, que cheguei a trocar de viatura, estava na 2ª e vim para a 3ª.
Bom o Alferes Silva ( Oper. Especias) dá ordem para arrancar.
Lá para os lados de Mombocó, a uns quilómetros de Cutia rebentou uma emboscada terrível. Era fogo por todo o lado, RPGs a rebentar, viaturas destruídas, etc etc. Lá conseguimos depois de muito tempo debaixo de fogo que o inimigo recuasse. Depois de tudo isto levanto-me e vejo um cenário inesquecivel, Gente muito ferida a precisar de ajuda, o Enfermeiro que por sinal era um furriel, dava em doido, não conseguia prestar assistência a todos aqueles rapazes. No meio daquela confusão havia alguns camaradas que jaziam mortos, vejo um, outro e outro, e ainda outro que não consegui identificar, pergunto a um camarada, quem é esse colega?
Respondeu-me.
É o Bonilha.
Nesta emboscada sofremos 4 baixas e 18 feridos, 9 dos quais vieram evacuados para o Hospital de Lisboa, inclusivé o comandante da Coluna, o Alferes Silva( Ranger)
O dia estava lindo e a tarde começara há bem pouco tempo. Tínhamos recebido instruções para nos prepararmos para fazer uma coluna a Mansoa. Há que fazer todos os preparativos que a missão assim o exigia. A tarde estava quente embora estivessemos na época das chuvas, portanto não podíamos esquecer o cantil da água e vai daí eu e o Bonilha ( nome carinhoso, de nome próprio Alexandre), que era do 1º pelotão, enquanto enchíamos os cantis de água ele lá me ia dizendo:
Quelhas não gosto nada desta coluna.
Tem calma Bonilha, Não há-de ser nada, não há-de ser nada, vais ver que é apenas mais uma coluna, ainda havemos da fazer muitas outras, daqui a pouco já cá estaremos novamente. Mas o rapaz, que era uma belíssima pessoa, parecia não acreditar muito em mim, mas lá tentei encorajá-lo, sabe Deus como, pois tinha plena consciência do perigo que representava aquela coluna.
Bom lá nos dirigimos para as viaturas que já estavam preparadas para arrancar. Não sei ainda hoje o que se passou, mas pareceu-me que havia qualquer desentendimento entre oficiais e furrieis sobre qual o pelotão que deveria ir na frente ( eramos dois pelotões, 1º e 2º ). Não quero adiantar mais sobre isso, mas julgo, se a memória não me está a atraiçoar, que cheguei a trocar de viatura, estava na 2ª e vim para a 3ª.
Bom o Alferes Silva ( Oper. Especias) dá ordem para arrancar.
Lá para os lados de Mombocó, a uns quilómetros de Cutia rebentou uma emboscada terrível. Era fogo por todo o lado, RPGs a rebentar, viaturas destruídas, etc etc. Lá conseguimos depois de muito tempo debaixo de fogo que o inimigo recuasse. Depois de tudo isto levanto-me e vejo um cenário inesquecivel, Gente muito ferida a precisar de ajuda, o Enfermeiro que por sinal era um furriel, dava em doido, não conseguia prestar assistência a todos aqueles rapazes. No meio daquela confusão havia alguns camaradas que jaziam mortos, vejo um, outro e outro, e ainda outro que não consegui identificar, pergunto a um camarada, quem é esse colega?
Respondeu-me.
É o Bonilha.
Nesta emboscada sofremos 4 baixas e 18 feridos, 9 dos quais vieram evacuados para o Hospital de Lisboa, inclusivé o comandante da Coluna, o Alferes Silva( Ranger)
Caro Manel. Mas quem é que esqueceu aqueles tempos ? Viveremos sempre dessas recordações até ao fim das nossas vidas.
ResponderEliminarCaro Manuel
ResponderEliminarPara reforçar o que diz o Jorge 'Portojo' deixa-me que te diga que é bem verdade aquela ideia que diz que "quem esteve na guerra dificilmente a abandona".
Podemos decidir 'esquecer', não falar desses assuntos (até porque vamos falar deles com quem?) mas na realidade as imagens vão e voltam, umas vezes mais nítidas, outras como que a quererem esbater-se, mas duma forma ou doutra estão 'cá dentro'.
Enquanto te lembrares, fala! Não há mal nenhum nisso. É uma forma de honrarmos os amigos, manter viva a sua memória e ao mesmo tempo melhorarmos a nossa autoestima.
Serão poucos os que foram por gosto. Foram muitos os que foram por sentimento de dever. Falar disso hoje, é quase uma 'obrigação', para que os nossos netos quando estiverem na idade do entendimento e procurem respostas para algumas das sua interrogações possam saber quem fomos.
Um abraço
Hélder S.
Olá Jorge,
ResponderEliminarObrigado por martilhares esta história do Quelhas. Com um fim fatídico. Infelizmente, histórias como esta partilham o nosso viver dia a dia.
Esquecer a Guiné?....Impossível! Naquele chão deixamos cair o nosso suor e as nossas lágrimas. Outros beijaram a terra com a sua própria vida. Tal qual esta história.
Um pequeno reparo na história, quando o Quelhas refere as chuvas. Se a memória não me falha, as chuvas começavam a cair um pouco mais tarde, lá para meados de Junho.
Um abraço do tamanho do Atlântico que nos une,
José Câmara
Camaradas, como foi triste e sangrenta a nossa vivência naquelas paragens.
ResponderEliminarGeração espezinhada, oprimida, vexada, a nossa!
Se ninguém nos respeita ou pelo menos nos recorda, que ao menos sejamos nós a recordar, a respeitar e honrar os nossos camaradas que tombaram na Guiné, como tu fazes neste teu texto.
UM ABRAÇO SOLIDÁRIO
Vasco da Gama
Quelhas
ResponderEliminarA terapia, pelo que passamos na Guerra, começa, exactamente, falando dela pelo seu nome.
As marcas, ficaram, nítidas, vivas, cruéis. Mas se as "vulgarizares" falando delas, verás que se esbaterão e tornarão um pouco mais suaves, menos tenebrosas e avassaladoras.
Falo-te pela própria experiência.
Mau, foram 44 anos em que me recusei a falar da "coisa".
Estes momentos de Encontro com Camaradas que "sabem" ouvir a mesma linguagem, representam o ombro amigo de um Amigo, de muitos Amigos, dos teus Amigos; que todos vivemos de modo idêntico, parecido, casos que não "se esquecem" porque fazem parte da nossa vivência passada mas que deixaram a marca de todo o nosso futuro.
Saudações, do
Santos Oliveira
Quelhas
ResponderEliminarA terapia, acerca do que passamos na Guerra, está em falar dela com naturalidade. Quanto mais falares menos traumática e mais suave te será.
Encontrares Camaradas com quem possas falar a mesma linguagem, é encontrares ombros Amigos que te suportam e entendem, porque sentiram os mesmos tormentos e também a necessidade de sentir identificação com essa proximidade.
Meu caro Amigo.
Incentivo-te a falares de tudo o que te vai pelas lembranças.
Verás que exorcizarás os medos que, afinal, todos sentimos e que sempre escondemos.
Falo por experiência própria.
Tardei 44 anos a "falar" da Guerra; depois que o fiz, a pressão das lembranças vai-se esbatendo pela positiva. Parece que as "coisas", afinal, já não têm aquela importância traumática que nos perturbou ao longo dos tempos, demasiados tempos.
A vida tem de correr o seu curso; cabe-nos a nós, conduzi-la pelo melhor caminho.
Abraço Solidário, do
Santos Oliveira
PS: Ontem e hoje, coloquei Comentários que, inexplicavelmente, aparecem insertos e depois desaparecem sem que perceba os porquês.
Veremos se este "passa"
Amigo Manel
ResponderEliminarNa verdade, não é uma história triste, pois histórias há muitas tristes e alegres, o que tu contas são factos tristes, pelos quais todos nós passámos de uma maneira ou doutra.
Revela também uma ironia do destino, que casos semelhantes a este se passaram na Guiné e que eu infelizmente conheço.
Vai desabafando
Até sábado
Um grande abraço para ti
Carlos Silva
Quelhas
ResponderEliminarA terapia, acerca do que passamos na Guerra, está em falar dela com naturalidade. Quanto mais falares menos traumática e mais suave te será.
Encontrares Camaradas com quem possas falar a mesma linguagem, é encontrares ombros Amigos que te suportam e entendem, porque sentiram os mesmos tormentos e também a necessidade de sentir identificação com essa proximidade.
Meu caro Amigo.
Incentivo-te a falares de tudo o que te vai pelas lembranças.
Verás que exorcizarás os medos que, afinal, todos sentimos e que sempre escondemos.
Falo por experiência própria.
Tardei 44 anos a "falar" da Guerra; depois que o fiz, a pressão das lembranças vai-se esbatendo pela positiva. Parece que as "coisas", afinal, já não têm aquela importância traumática que nos perturbou ao longo dos tempos, demasiados tempos.
A vida tem de correr o seu curso; cabe-nos a nós, conduzi-la pelo melhor caminho.
Abraço Solidário, do
Santos Oliveira
Manel
ResponderEliminarJá coloquei um comentário, o qual desapareceu.
Deve ser problema do programa informático do Blogue que gera automaticamente este tipo de problema. que também aconteceu com o Santos Oliveira.
Tinha dito eu que:
Histórias tristes e alegres há muitas.
O que tu contas são factos reais que são do nosso conhecimento.
Ironia do destino
Infelizmente tenho conhecimento de várias situações semelhantes - ironia do destino -
Vai desabafando.
Até sábado
Recebe um abraço amigo
Carlos Silva
Amigo Manel
ResponderEliminarNa verdade, não é uma história triste, pois histórias há muitas tristes e alegres, o que tu contas são factos tristes, pelos quais todos nós passámos de uma maneira ou doutra.
Revela também uma ironia do destino, que casos semelhantes a este se passaram na Guiné e que eu infelizmente conheço.
Vai desabafando
Até sábado
Um grande abraço para ti
Carlos Silva
Já coloquei um comentário, o qual desapareceu.
ResponderEliminarDeve ser problema do programa informático do Blogue que gera automaticamente este tipo de problema. que também aconteceu com o Santos Oliveira.
Tinha dito eu que:
Histórias tristes e alegres há muitas.
O que tu contas são factos reais que são do nosso conhecimento.
Ironia do destino
Infelizmente tenho conhecimento de várias situações semelhantes - ironia do destino -
Vai desabafando.
Até sábado
Recebe um abraço amigo
Carlos Silva
Uma nota aos comentários.
ResponderEliminarAmigos, um problema qualquer nao permitiu a publicação ou fez desaparecer os comentários do Carlos Silva e do Santos Oliveira. Parecerão repetidos, mas foram escritos em horas diferentes.
Contra estes problemas não podemos fazer nada.
Um abraço a todos. E sábado lá estamos, mas amanhã há Matosinhos.